Desde 2022 que grandes tecnológicas internacionais, como a Google, Microsoft e a Nokia, têm recorrido ao layoff para dispensar grandes números de profissionais dos seus quadros. Também Portugal tem registado esta tendência no que toca aos despedimentos na área das Tecnologias da Informação (TI) em empresas com algum prestígio como a Talkdesk e mais recentemente a Farfetch. Contudo, há muito que pode ser feito, mesmo antes da dispensa acontecer e durante o processo, para minimizar os impactos negativos desta situação. Neste artigo exploramos algumas formas de te preparares para esta situação caso alguma vez te aconteça.
Como chegamos a esta situação?
Em 2023, mais de 240.000 profissionais foram dispensados globalmente em empresas tecnológicas como a Amazon, Meta, Cisco, entre outras. Empresas estas onde muitos profissionais sonhavam trabalhar não só pelos projetos desenvolvidos, mas também pelas regalias, benefícios e pacotes salariais que acompanhavam as suas propostas.
Com a pandemia, essa oportunidade chegou com a contratação em massa que estas empresas realizaram no seguimento da onda de digitalização e da adoção do trabalho remoto. Agora, a bolha parece ter rebentado e as empresas decidiram dispensar grandes números de trabalhadores, na sua maioria da área das TI.
Quem se vê nesta situação, acaba por sofrer muito rapidamente uma mudança na sua vida a vários níveis - profissional, financeiro e de rotinas -, muitas vezes acompanhada pela preocupação e medo do futuro. Quem ainda não passou pela situação, pode também sentir receio e questionar-se se será o próximo. E se for, o que deve fazer?
Na verdade existe muito que se pode fazer mesmo antes de receber a notícia sobre o despedimento. Aqui ficam algumas dicas.
Antes do despedimento: serei o próximo?
Se te encontras preocupado com esta possível situação podes começar por tentar perceber como está a saúde financeira da empresa onde trabalhas. Caso a mesma esteja cotada em bolsa, podes acompanhar o seu desempenho e encontrar a informação relevante publicamente. Se não for o caso, deves prestar especial atenção às reuniões gerais da empresa e à partilha dos indicadores e objetivos financeiros da mesma. Se o volume de negócio da mesma estiver estagnado ou em queda, não será má ideia começares a preparar-te.
E como podes fazer isso? Scott Dobroski, especialista em desenvolvimento de carreira do Indeed, num artigo do The New York Times, recomenda que todos os profissionais façam anualmente um “check up” à sua carreira. Da mesma forma que vamos anualmente ao médico verificar se está tudo bem com a nossa saúde, o mesmo deve ser feito com o nosso currículo. É importante que o mesmo esteja atualizado e reflita todas as competências adquiridas e os projetos mais relevantes em que participaste.
Para além disso, deves ainda apostar no networking principalmente fora do grupo social e profissional em que te encontras. Muitas vezes, as melhores oportunidades nem chegam a ficar disponíveis publicamente ou mesmo que estejam é sempre bom quando o teu CV vai acompanhado de uma boa recomendação.
Mesmo que não estejas atualmente numa busca ativa de novos projetos, dar a conhecer as tuas competências e tornar o teu perfil conhecido e uma referência na tua área é sempre uma mais valia. A presença ativa no Linkedin é uma excelente forma de conseguires comunicar rápida e facilmente com outros profissionais e aumentares a tua rede de contactos.
Procura atualizar o teu perfil nesta rede, através de um sumário bem construído, não esquecendo a escolha acertada das palavras chave que vão fazer o teu perfil destacar-se nas pesquisas dos recrutadores.
Por fim, se a tua empresa atual te oferece benefícios relacionados com a aprendizagem, como um plafond de formação, agora é a hora de os usar. Analisa as áreas técnicas em que sentes que podes melhorar ou tens interesse em crescer profissionalmente e avança com uma formação na área. Desta forma vais valorizar ainda mais o teu CV e terás a oportunidade de reforçar a tua rede de contactos através das pessoas que irás conhecer nas aulas (caso seja neste formato).
Fui dispensado e agora?
Ser despedido é uma situação bastante complicada de gerir que pode ter um grande impacto na saúde mental do afetado. Para além da perda financeira, existe ainda a perda de estrutura, rotina, relações e sentimento de estabilidade. Estes sentimentos são ainda acompanhados frequentemente de medo e receio sobre o futuro e os próximos passos.
Assim, numa fase inicial é necessário que exista tempo para a aceitação e processamento das emoções. Tudo o que podes estar a sentir é válido e normal. O importante é que depois deste espaço, não te foques apenas no que falhou e procures valorizar e demonstrar os pontos positivos do teu perfil enquanto profissional.
Paralelamente, é ainda importante dedicares algum tempo à leitura dos teus deveres e direitos legais aquando da saída da empresa. As normas relativas aos despedimentos estão definidas no Código do Trabalho, cuja legislação foi revista em 2023.
Se tiveres sido abrangido por um despedimento coletivo, extinção do posto de trabalho ou inadaptação, terás direito a uma compensação equivalente a 14 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, se o contrato tiver sido celebrado após a entrada em vigor da nova legislação. Aos contratos realizados anteriormente, aplicam-se 12 dias de retribuição. Procura ajuda legal caso tenhas dúvidas, para teres a certeza de que estás a ser confrontado com o melhor cenário possível e possas ter uma saída positiva.
Atualiza o teu CV e Linkedin
Depois de teres estas questões legais e logísticas orientadas, é hora de te focares na procura de um novo projeto. Se ainda não o fizeste, dedica-te a atualizar e melhorar o aspeto visual do teu currículo (CV).
Os dias em que apenas interessava a experiência profissional numa vertente técnica já lá vão. Agora, é preciso saber apresentar a informação de forma apelativa e estratégica para que te consigas destacar dos restantes profissionais e aumentar as tuas chances de seres chamado a entrevista e contratado para o projeto que procuras.
Verifica se tens as informações de contacto mais relevantes visíveis e atualizadas no início do CV, se a tua experiência profissional se encontra organizada pela ordem certa e se incluíste todas as ferramentas e plataformas que dominas. Paralelamente, deves procurar escolher uma fonte profissional e legível, usar espaçamento adequado e destacar sempre as informações mais importantes.
Estar ativo no Linkedin é também essencial para conseguires mais rapidamente recuperar do despedimento ou layoff. Ter um perfil otimizado com as palavras chave certas e a informação mais importante são dois processos fundamentais para que consigas atrair a atenção de recrutadores e hiring managers.
Grande parte das pesquisas feitas no Linkedin, recorrem a keywords específicas. Desta forma, ter um perfil completo com a informação mais relevante é fundamental para que o mesmo surja nas pesquisas. Também muitos dos softwares de análise curricular automáticos que as empresas usam, recorrem ao rastreamento de palavras chave, por isso é importante fazer um bom uso delas no CV.
Para além disso, é ainda fundamental adicionar a informação de contacto e o que procuras (ou não) na descrição do perfil do Linkedin, sendo específico e explicando bem quais é que são as tuas valências técnicas.
Por fim, estar ativo na plataforma é a melhor forma de trazeres dinamismo ao teu perfil. Depois de um despedimento coletivo, principalmente quando falamos de empresas como as tecnológicas que atraem um certo ruído mediático, é normal que as pessoas estejam mais sensíveis e procurem unir-se como forma de ultrapassar esta situação e ajudar os colegas que se encontram no mesmo barco. Por isso procura publicações de outros profissionais que estejam a passar pelo mesmo e interage com estas. É comum existirem publicações onde diversas empresas solidárias comentam com vagas de emprego, por isso explora-as e faz notar-se a tua presença. Esta é uma ótima forma de fazeres networking, sendo algo que te vai ajudar a chegar mais longe profissionalmente.
Faz um orçamento
Fazer uma avaliação das finanças pessoais é essencial nesta fase que traz muitas incertezas consigo. Fazer um orçamento familiar poderá ser um bom ponto de partida para teres um maior controlo sobre as tuas despesas e receitas.
Começa por abrir uma folha no Excel ou pegar num papel e caneta e criar três colunas: uma para as receitas onde irás registar todos os rendimentos obtidos mensalmente (rendas, subsídios, etc); uma para as despesas onde colocas todos os teus gastos mensais sejam fixos ou variáveis (créditos, seguros, eletricidade, telecomunicações, alimentação, lazer, etc); e outra para a poupança com todos os valores que costumas poupar todos os meses.
Agora é hora de organizar as despesas por nível de importância e ver por onde podes cortar ou diminuir os gastos até voltares a poder contar com o salário mensal. Poderás começar por definir objetivos financeiros como um valor mensal que pretendes poupar e cortar nas despesas não essenciais, mesmo que temporariamente, como as refeições fora de casa ou os serviços de streaming por exemplo.
Outro passo importante será rever e renegociar alguns gastos mensais. Analisa as tuas faturas recentes e faz um pequeno estudo de mercado para perceber se existem melhores ofertas que possas usar a teu favor para facilitar a negociação. Depois contacta as empresas fornecedoras e procura perceber se existe margem para reduzir o valor mensal, nem que seja através da redução de algum serviço não essencial.
Poderás ainda fazer o mesmo com os créditos que tenhas como é o caso do crédito à habitação que por norma absorve uma parte significativa da receita mensal. Aspetos a negociar poderão ser o spread, o prazo indexante, o regime da taxa de juro, o prazo para pagar o empréstimo ou a modalidade de reembolso.
Cuida da tua saúde física e mental
Com as urgências diárias e “fogos por apagar” do trabalho é normal que descuidemos um pouco da nossa saúde ou a deixemos para segundo plano. No entanto, quando situações como esta acontecem, percebemos que na verdade a nossa saúde e bem estar são o mais importante.
Para além disso, a vida pessoal é também um dos pilares mais importantes e que vai ajudar a ultrapassar mais fortemente períodos instáveis como este. Por isso, se não o fizeste antes, aproveita esta fase para fortalecer as tuas relações pessoais e cuidar do teu bem estar pessoal. Estabelece uma rotina onde, para além da procura de um novo emprego, incluas exercício regular, o cuidado com a tua alimentação e tempo de qualidade.
Notas finais
É fácil sentir uma certa vergonha, culpa, frustração ou até raiva depois de um despedimento. No entanto, é importante perceber que estes despedimentos coletivos não são pessoais e procurar tirar algo positivo desta situação, saindo mais forte da mesma. É uma oportunidade para recomeçar, dar início a uma nova vida com um trabalho, colegas e projetos novos. Para os mais aventureiros, poderá ser ainda uma forma de explorar novos hobbies ou side hustles, criar um negócio ou avançar enquanto freelancer.
Assim, esperamos que estas pequenas dicas possam ajudar todos aqueles que se encontram a passar por um despedimento coletivo ou que se pretendam preparar para um. Podes ainda explorar os nossos projetos e o nosso podcast onde partilhamos vários insights sobre o mercado de trabalho português e formas de conseguir evoluir profissionalmente: